Sempre tive interesse em ficar lembrando do passado, mas constantemente me lembrava das mesmas situações, tanto o que eu considerava bom quanto o que eu considerava ruim. Percebia que eu lembrava mais das coisas boas que das ruins. Dentre as que eu considerava ruins estavam as que eu achava engraçadas, e as em que eu me sentia injustiçada e de que não tinha motivos conceituais para esconder. Tinha apenas o objetivo de mostrar que fui injustiçada ou que, apesar de considerar ter sido maltratada, justificava que era importante ter vivido para ter aprendido alguma lição. Tudo isso em uma visão infantil de que o outro é responsável pelo meu sofrimento.
Observando situações atuais em que me vi surpreendida por ter feito escolhas que não imaginava fazer, comecei a considerar que existem coisas em mim que desconheço. Antes poderia negar que tinha certos sentimentos, mas diante de fatos que não podem ser negados, por estarem por mim sendo observados, comecei a considerar que faço coisas sem perceber, sem saber por qual motivo as faço. Isto eu tenho chamado de inconsciência.
Apesar de considerar que tenho consciência de que existo – consciência humana – não sei para quê existo nem o motivo de eu ter determinado comportamento ou de fazer determinada escolha. Se não sei e se consigo perceber algo que fiz apenas depois de ter feito, não sou consciente de minhas atitudes, apesar de ter antes acreditado que era. São apenas crenças e, se eu acredito, posso fazer com que se torne real, pelo menos para mim.
Com esta constatação de que sou inconsciente e que posso criar uma realidade – minha realidade – a partir do que acredito ser melhor para mim ou, quero dizer, para minha sobrevivência física e emocional, comecei a considerar que me lembro pouco de minha história. Comecei a considerar que lembro muito pouco de fatos de minha infância, puberdade e adolescência, e que os fatos, de que me lembro, talvez não tenham acontecido exatamente da maneira como minha memória me mostra.
Quando fiz graduação em fonoaudiologia, aprendi o quanto a infância, principalmente até os três anos de idade, é importante para o aprendizado, devido ser o período de mais intensa plasticidade cerebral1. Tive informações de que é o período em que mais devemos estimular a criança para as funções como a linguagem, no caso da minha profissão, e que, o que ela aprendesse naquele período, seria a base para o restante do período de sua existência. A partir dessa época, em que fiz esta graduação, comecei a considerar o quanto é essencial dar-se importância à fase infantil humana.
Nos últimos quatro anos, tendo contato com outros materiais elaborados por educadores de essencialidades a partir dos estímulos dos ambientes do Sistema Tempo de Ser, tenho considerado mais ainda a importância de todo o período infantil até à adolescência, principalmente os primeiros três anos da existência, para a formação da pessoa humana em todos os aspectos2,3. Além disso, a informação de que minhas escolhas e comportamentos atuais têm base nesse período estimulou-me a ter um profundo interesse por estas fases da minha existência. Estimulou meu interesse pela minha história, principalmente pelo que dela não me lembro. Estimulou meu interesse por tudo em mim, que está inconsciente para mim. Estimulou o interesse por mim mesma.
Com isto considero que a minha história é o que tenho para poder chegar a mim mesma. Olhar para esta história sem julgamento, aceitando-a como ela é e fazendo uma releitura, indo além da imaginação, tem sido meu maior desafio.
Daniene Tesoni Cassavara Ribeiro
Educadora de Essencialidade do Núcleo de Aprendizagem de Birigui
Sistema Tempo de Ser – Educação de Essencialidades
Referências
- Organização dos Estados Americanos. Primeira infância: um olhar desde a neuroeducação. Edição do projeto: Cerebrum – Centro Iberoamericano de Neurociências, Educação e Desenvolvimento Humano; 2010. p. 45-58.
- Carvalho C, Zacarias C. Prisioneiros da infância. São Paulo: Editora Tempo de Ser; 2012. p. 31-38.
- Carvalho C, Zacarias C. Crescer Dói?!. São Paulo: Editora Tempo de Ser; 2014. p. 19-25.
Contos e Autoencontros
A não compreensão e entendimento do mundo interior levam-nos à busca de efetivar meios de auto-observação, para que fiquem visíveis atitudes e sentimentos que nos movimentam. Um dos meios para observarmos nossas movimentações é a descrição do nosso percurso como educador de essencialidades. O texto publicado anteriormente é uma autodescrição resultante de um projeto elaborado pelos Educadores de Essencialidades do Núcleo de Aprendizagem de Birigui do Sistema Tempo de Ser, dentro da atividade do grupo vespertino de Prática de Inteligência Mediúnica. O projeto tem como proposta a exposição ao meio social das repercussões dos estímulos de autoaprendizagem aos educadores de essencialidades nos ambientes do Sistema Tempo de Ser. Durante sua execução, tem sido considerado que o “autoencontro” pode ocorrer a partir da auto-observação e autodescrição dos “Contos” (história imaginada) que permeiam a existência humana.