Reflita comigo por alguns minutos, porém recomendo que permaneça um tempo nesse primeiro parágrafo antes de prosseguir nos próximos. Como você acordou se sentindo? Como se sente neste exato momento? Quais os sentimentos e emoções predominam e norteiam sua relação consigo mesmo e com o outro? Qual poder tem sobre eles? Quais os pensamentos que se destacam e orientam o seu modo de pensar a si mesmo e ao seu entorno? Qual o seu grau de participação em seus pensamentos? Como isso tudo se processa dentro de você?
Talvez uma inquietante sensação tenha transpassado a sua intimidade enquanto estava meditando sobre as questões acima. Um certo estranhamento ou pelo silêncio ensurdecedor ou por sentir-se incapaz de responder, suficientemente, as questões propostas. Se experimentou essa inquietação, para nós da Educação de Essencialidades, então há indícios de vida interior desconhecida.
A humanidade atual é resultado da evolução das espécies. Somos um dos primatas que ainda permanecem após milhares de anos e incontáveis lutas de sobrevivência e adaptação em ambientes extremos, diante da variabilidade de tantas espécies. Certamente, de acordo com Darwin [1], não somos o resultado do parentesco direto de macacos primitivos em uma sequência linear, mas, por parentesco, temos um descendente comum.
O ser humano é um animal racional, qualidade a partir da qual se tornou um animal social e político. Organizamos comunidades sociais e políticas. Aprendemos a conviver, em certa medida, com outros seres humanos e outros espécimes. Desenvolvemos a capacidade tecnológica e aperfeiçoamos o modo como sobrevivemos. Contudo, apesar de aperfeiçoarmos a forma de sobrevivência, por que ainda sofremos? Qual a origem das dores de nosso tempo?
Afirmam, Wildemberg e Costa [2], na obra Inteligência Mediúnica [3], que a “linguagem interna do homem é o sentir”. Visto desse modo, o ser humano é dotado de uma característica fundamental, sensível, que lhe permite sentir não somente o seu entorno, mas, também, sua intimidade.
Como seres sensíveis, nossos órgãos sensoriais nos permitem sentir, identificar e representar na mente objetos, pessoas, ambientes, pontos de dor e prazer no corpo; são as interações exteriores que experimentamos dia a dia. Somos afetados por inúmeros estímulos, desencadeando no meio e nas relações: ações, reações e comportamentos. Ou seja, somos direcionados ou nos direcionamos a partir da interação do meio com a nossa sensibilidade.
Comparando o homem primitivo com o atual, Wildemberg e Costa afirmam que “da primitividade à atualidade a humanidade constantemente procura superar aquilo que identifica como incômodo, e foi justamente na tentativa de eliminá-lo que as sensações experimentadas no decorrer do aprimoramento da sobrevivência, na luta contra a morte, foram acumuladas em sua memória biológica e que hoje repercutem no mundo íntimo dele, como sentimentos” [4].
Somos herdeiros dos incômodos que permearam as preocupações de nossos antepassados. Sinal disso é a nossa contínua necessidade de sobreviver. A humanidade atual se move, tanto quanto a primitiva, pela necessidade de sobrevivência. E como foi argumentado no parágrafo acima, os movimentos de sobrevivência não impressionaram somente as organizações coletivas e sociais do homem atual – nessa selva de pedra –, mas a organização íntima, uma verdadeira savana inóspita cheia de incômodos emocionais, justificando a necessidade de sobreviver emocionalmente.
Há vida interior e a sua dimensão, também, é emocional. Quanto a conhecemos? Quanto a desbravamos? Quanto a dominamos? Não me refiro como movimento social através das inúmeras ciências somente, mas do indivíduo para ele mesmo. Nesse ponto, é fundamental retomarmos as questões do primeiro parágrafo, pois se elas suscitaram uma sensação de silêncio ou de inquietação, isso implica que temos uma vida interior que orienta necessidades, pensamentos, comportamentos, desejos, interesses, conflitos, um sentido de vida, porém ainda desconhecida.
Se a evolução das espécies descreve, pela seleção natural, a permanência dos mais adaptados aos variados ambientes inóspitos, entre eles o ser humano, será que o sentimento de inadaptação que sentimos em nossa intimidade, nesse ambiente desconhecido e também rude, é sinal de que estamos diante de um terreno desconhecido e perigoso? Quais os perigos que permeiam nossa intimidade enquanto indivíduos e espécie? Se desconhecemos essa dimensão subjetiva, para onde a humanidade deseja caminhar?
A partir desse ponto de vista, o autoconhecimento se torna uma necessidade na medida em que nos deparamos com uma outra fronteira desconhecida: nossa intimidade. E que tem necessária repercussão não somente na vida do sujeito que se desconhece, mas nos grupos sociais de que faz parte. Do indivíduo ao coletivo, e vice-versa, as influências do desconhecimento de nossa intimidade tem impacto decisivo para a condução da humanidade.
Ainda ecoa a voz da presença socrática incorporada pela famosa frase do templo de Delfos “Conhece-te a ti mesmo”. Contudo, impossível ouvi-la sem considerar a vida interna que direciona nossas ações na existência, sem que tenhamos muita ou qualquer participação. As dores do parto de saberes mais lúcidos sobre nós mesmos são sentidas, por cada um de nós, como verdadeiras contrações dolorosas. Porém, para onde mais ir senão na direção de nossa intimidade?
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[1] Charles Robert Darwin foi um naturalista, geólogo e biólogo britânico. Autor da famosa obra A Origem das Espécies.
[2] Marlete Wildemberg e Lucas da Costa são palestrantes, coordenadores de cursos e autores dos livros “Inteligência Mediúnica e Educação de Essencialidades”.
[3] Costa, Lucas da; Wildemberg, Marlete. Inteligência Mediúnica: novos horizontes da sensibilidade. – São Paulo: Comissão Gestora do Projeto Tempo de Ser, 2012.
[4] Ibidem.
Parabéns, palavras sábias.