Onde está minha criança? Em quais esconderijos psíquicos
ela se esconde? Que defesas ela utiliza? Quais suas
dores e temores, seus desejos e necessidades? Em que momentos
ela irrompe e se mostra?
Como é essa criança? Irritadiça, birrenta e caprichosa?
Triste e amargurada? Solitária e magoada? Tem raiva,
essa criança? Quem são seus mitos? Quem ela imita? Por
quem deseja ser mais amada? Por quem se sente rejeitada?
O que lhe fere os sentimentos? Como se defende e foge de
suas dores? Agride, esperneia ou fica indiferente? Faz-se de
boazinha ou se entrega à rebeldia? Afinal, que recursos essa
criança utiliza para sobreviver emocionalmente?
Quem pode resgatar essa criança ferida e abandonada,
que grita, contorce-se e estertora de dor, clamando suplicante:
Socorro! Sinto-me desprezada, abandonada e sem valor!
Quem poderá auxiliar essa criança que agoniza entre
silêncios e brados de dor, que não cresce e continua à espera
de um consolo, uma mão amiga, uma migalha de afeto?
Criança tão presa a sua agonia, nem percebe que o
socorro já veio… o tempo passou e ela estacionou. Seu corpo
já se metamorfoseou e a idade adulta chegou!
De frágil e vulnerável, dependente e carente, hoje é
senhora da sua vontade e pode os seus passos direcionar,
pois tem potencial para, a si própria, amparar.
Querida criança, acorda! O tempo passou!
Seus pais, outrora deuses e mitos em sua mente infantil,
hoje ou já se foram ou envelheceram. De tão fortes e
poderosos que pareceram à imaginação infantil, tornaramse
imagens estereotipadas e forças represadas na sua intimidade.
Imagens que ainda a aprisionam, constrangem e a
mantêm cativa de uma forma infantil de sentir a vida.
… hora de libertar seus pais e olhá-los como individualidades
que são: nem deuses nem monstros, simplesmente
um homem e uma mulher, seres limitados e constrangidos a
viver de padrões, tanto quanto você.
… preciso derrubar o mito paterno e materno e perceber
que seus pais carregavam neles as próprias dores e que,
por mais que desejassem, não puderam dar aquilo que eles
mesmos não possuêam. São tão ou mais crianças que você
e, presos às suas próprias feridas infantis, não conseguem
enxergar em você alguém além deles mesmos.
Adulto, encontre a sua criança! Abrace-a!
Criança, não se esconda do seu adulto! De agora em diante ele é seu
pai e sua mãe, seu irmão e seu amigo. Só ele e mais ninguém
pode a sua verdade encarar e a dor enfrentar.
Liberte-se, Criança, dos grilhões do passado e, amparada
pela mão forte de seu adulto, deixe-se guiar pelo caminho
que a levará a si mesma.
Carinhosamente,
De um adulto para a sua criança
Esta carta, integra o Livro Prisioneiros da Infância, página 179.
Autoras: Cláudia Lourenço e Cláudia Zacarias
Uma realidade nossa.
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